terça-feira, 3 de junho de 2008

O Telefonema

Oi, desculpa não ter te ligado antes, você está sempre tão ocupado... Mas agora espero não estar atrapalhando. Só precisava te contar o que aconteceu comigo nesses dias... Eu sofri um acidente. Um contratempo.

Quer dizer, na verdade foi um choque terrível, minhas pernas ainda tremem, não consigo falar direito, você deve estar percebendo como minha voz está estranha. Isso aconteceu já faz quase uma semana. Eu já fiz diversos exames, ainda estou internada no hospital.


O médico disse que meu caso é grave, preciso fazer mais exames... Essa ladainha já dura uma semana, como acabei de dizer. Mas você não precisa se preocupar, eu vou ficar bem, eu acho. Quando entrei aqui, achei que não ficaria mais de dois dias, mas aí descobriram que meu caso é mais grave do que se imaginava. Gravíssimo para dizer a verdade. Mas disseram que eu posso ficar bem, caso existam milagres. Você acredita em milagres? Aposto que não.


A enfermeira trouxe a pouco os remédios. Nunca pensei que fosse tomar tantos num só dia! Acho que trocaram os exames, sabe. Eu me sinto bem, a minha cabeça dói um pouco, mas é só. Queria muito que você estivesse aqui. Era só o que eu queria, na verdade.


Desde que deitei nesta cama pela primeira vez, parece que não querem mais me soltar. Você podia me tirar daqui, não é mesmo? Prometo que fico boa logo. Eu nem estou mais doente! Nunca estive, pra dizer a verdade! Preciso fazer os exames com outro médico, os daqui não sabem de nada. Eles acham que eu sou louca! Por favor, quando tiver um tempinho, apareça, mesmo que seja apenas para uma visita...
Qualquer coisa me liga, tá? Tô te esperando.

* A mulher desligou o telefone de brinquedo. Entregou-o a outro paciente, que ansiava por brincar de telefonar também. Enxugou as lágrimas no vestido do hospital psiquiátrico. Ao olhar a foto ao lado da cama, dormiu como uma criança.


O ator da novela estava sem camisa no porta retrato. A psiquiatra trouxe mais revistas. Recortou algumas com atores famosos e cantores e deixou em cima do criado mudo. Mais tarde ela acorda, e troca a foto do porta-retrato. Talvez ligue para a filha amanhã, se o telefone estiver desocupado.

3 comentários:

  1. não não, eu axei fôfo... super fôfo... sei lá, serve pra tantas reflexões sobre a solidão que sentimos tantas vezes que estamos dentro de multidões, tantas vezes mais quando a nossa necessidade de carinho e escuta nem sempre é atendida ou é preterida por outras necessidades... é, é fôfo.

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  2. Ebaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa...
    Um dos meus contos favoritos foi publicado!!! =)
    Melancólico...mas muito poético...

    Cadê o da galinha?..rsss....

    Um beijão, minha MA favorita!!!

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