terça-feira, 17 de junho de 2008

Somente o necessário...

"Uns tomam éter, outros cocaína
Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria"
(Não sei dançar - Manuel Bandeira, 1925)

Passei o dia inteiro pensando no post de hoje. Devo dizer que as terças-feiras tornaram-se sagradas pra mim, como 'o dia em que eu tenho que escrever algo no blog'. Mas, como acontece quase sempre, não tinha sobre o que escrever. Até pedi sugestões. Só que... por uma razão ou outra falar sobre violência pura e simplesmente não era a pauta do dia pra mim; apesar do Milton tentar me convencer piamente de que eu deveria falar sobre os dez caras que espancaram um rapaz de 23 anos na saída de uma boate em Sorocaba - SP.

"Não, chega de falar de violência. Meu último post já foi sobre isso. Pelo menos hoje!!", pensei.

Pausa.

É... Ok. Mas eu continuava sem assunto. Durante toda a tarde, minha "conversa-terapia" com a Rosa, me fez pensar sobre nossa grande necessidade de. Aí, chego no estágio, às 17h30 e, sem internet, resolvi ler o suplemento trainne da Folha de S. Paulo de 2004.

Pois bem. Abri o caderno e dei de cara com a frase acima.
Temos sempre necessidade de alguma coisa. Uma resposta, um amigo, uma bebida, um sorriso, qualquer coisa. Pequenas coisas, grandes valores. O problema é: cada um tem sua necessidade.
Que fazer então para lidar com nossas necessidades e as dos outros? Que fazer para compreender que o outro tem necessidades diferentes das minhas? Posso compreendê-lo? Devo?

Voltando pra minha ilustra sugestão de pauta, quero só deixar claro que o caso passou do limite do que eu considero passível de comentários. Até porque, todo mundo sabe que discordo absolutamente de qualquer tipo de violência, ainda mais quando gratuita.
E aí, me pergunto: que tipo de necessidade move alguém que parte para este tipo de violência? Necessidade de satisfazer-se com o sofrimento alheio, é necessidade?

Ah, só pra constar, o texto do pessoal em treinamento da Folha é muito bacana, trata do século XXI como o "século do vício". Somos todos viciados em alguma coisa. Resumindo, temos todos necessidade de alguma coisa, ou de várias coisas ao mesmo tempo...

Abaixo, o poema completo de Manuel Bandeira


Não Sei Dançar

Uns tomam éter, outros cocaína.
Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria.
Tenho todos os motivos menos um de ser triste.
Mas o cálculo das probabilidades é uma pilhéria...
Abaixo Amiel!
E nunca lerei o diário de Maria Bashkirtseff.
Sim, já perdi pai, mãe, irmãos.
Perdi a saúde também.
É por isso que sinto como ninguém o ritmo do jazz band.
Uns tomam éter, outros cocaína.
Eu tomo alegria!
Eis aí por que vim assistir a este baile de terça-feira gorda.
Mistura muito excelente de chás...
Esta foi açafata...
- Não, foi arrumadeira.
E está dançando com o ex-prefeito municipal:
Tão Brasil!
De fato este salão de sangues misturados parece o Brasil...
Há até a fração incipiente amarela
Na figura de um japonês.
O japonês também dança maxixe:
Acugelê banzai!
A filha do usineiro de Campos
Olha com repugnância
Para a crioula imoral,
No entanto o que faz a indecência da outra
É dengue nos olhos maravilhosos da moça.
E aquele cair de ombros...
Mas ela não sabe...
Tão Brasil!
Ninguém se lembra de política...
Nem dos oito mil quilômetros de costa...
O algodão do Seridó é o melhor do mundo?... Que me importa?
Não há malária nem moléstia de Chagas nem ancilóstomos.
A sereia sibila e o ganzá do jazz-band batuca.
Eu tomo alegria!

(Petrópolis, 1925)

3 comentários:

  1. Ta aí uma ótima pauta, falar sobre vícios e manias!!
    Dá pra aprofundar legal em um novo texto.
    Quanto a violência... Desculpe-me pela sugestão, mas é inevitável fugir dela no dia-a-dia.
    Aliás...
    Tenho uma outra idéia legal quando vc não tiver assunto. Só que dessa evz vc vai me chamar de doido XD

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  2. sobre violência? aff... é só ligar no plantão alagoas, plantão de polícia, do tipo violência física e escancarada nas nossas casas... ou na TV Senado ou TV Câmara durante uma sessão de debates, violência simbólica sobre a nossa inteligência..

    sobre necessidade? aff.. eu ando viciado em blogs, de hoje q eu descubro um monte e vou comentando em todos.. vício em chocolate.. hum.. incrível como todos temos mesmo é necessidade de mudar, mesmo que não percebamos. Querer algo é querer mudar, a si ou aos outros, é não aceitar nem a si nem ao outro, muito menos às vontades do outro. será? não sei. talvez, quem sabe.

    Um outro post é necessário!!!

    PS: o conto é muito fôfo, cenário cheio de detalhes... me fizeram comer o texto 3 vezes!! valeu!!

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  3. Hum...
    Como diz a introdução de "Comida" dos Titãs:
    "Desejo / Necessidade / Vontade"
    São coisas diferentes... Já nascemos tendo necessidades: de comer, de beber água, de fazer cocô, xixi. E vamos adquirindo outras: de afeto, etc. Ter "necessidade de" é inerente a qualquer ser vivo.

    Acabei indo ao dicionário pra me ajudar aqui: =)

    Necessidade - Aquilo que é inevitável, fatal.

    Vontade - 1. Faculdade de representar mentalmente um ato que pode ser ou não praticado em obediência a um impulso ou a motivos ditados pela razão; 2. Sentimento que incita alguém a atingir o fim que essa faculdade propõe.

    Desejo - Vontade de possuir ou de gozar.

    Ninguém, em hipótese alguma, tem necessidade de espancar alguém. É só vontade. Vontade que, por falta de educação, afeto ou por qualquer outro motivo, não foi repreendida.
    Na minha opinião, vício não é necessidade. Acho que seria uma vontade completamente descontrolada, mas, ainda assim, que não se configuraria uma necessidade.
    Por outro lado, acredito que escrever para um poeta seja uma necessidade.
    Afff... É difícil explicar quando nós mesmos somos o objeto de análise... =P

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